quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Frei Luiz Cappio retoma a greve de fome

O bispo de Barra, na Bahia, Luiz Flávio Cappio, iniciou na terça-feira uma nova greve de fome em protesto contra as obras de transposição do rio São Francisco, acusando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva de "enganar" a população ao descumprir a promessa de discutir publicamente o projeto. Cappio havia realizado uma greve de fome de 11 dias em 2005 pelo mesmo motivo.

Em entrevista à Rede Record na noite desta terça-feira, Lula afirmou que não irá se intimidar com a greve de fome do bispo e lamentou a retomada do protesto.
"O bispo me coloca numa situação complicada, porque eu tenho que escolher entre ele, que está fazendo uma greve de fome premeditada, e 12 milhões de nordestinos ... que precisam da água para sobreviver. E não tenha dúvida que eu ficarei com os pobres deste país."


Neste ano, o governo incluiu a transposição do São Francisco no seu Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e enviou o Exército para iniciar a obra, sem responder a uma carta enviada por Cappio em fevereiro a Lula.

"Para que eu interrompa o jejum é mediante essas duas exigências: primeiro, o arquivamento do projeto, e segundo, a retirada do Exército", disse o bispo por telefone.

Cappio enviou na terça-feira uma nova carta em termos duros ao presidente.
"Até agora não obtivemos resposta", disse o prelado. "Minha vida inteira foi na luta do PT. A vida inteira vesti a camisa do presidente, só que infelizmente, desde que ele chegou lá (ao poder), se esqueceu dos que estão do lado de cá", completou.
Ele afirmou que não poderia aceitar que o rio, responsável pela subsistência de milhões de pessoas, fosse desviado "para transformar a água em benefício de alguns, em detrimento da vida de muitos".


Em sua nova carta, Cappio lembra as promessas do governo de debater o projeto, o que segundo ele não ocorreu. "O sr. não cumpriu sua palavra. O sr. não honrou nosso compromisso. Enganou a mim e à sociedade brasileira", escreveu. "Portanto, retomo meu jejum e oração. E só será suspenso com a retirada do Exército das obras e o arquivamento definitivo."

O bispo, como outros críticos do projeto, afirma que há outras propostas para levar água ao resto do Nordeste. Roberto Malvezzi, da Comissão Pastoral da Terra (CPT), da Igreja Católica, disse que o bispo "está querendo fazer uma reflexão mais profunda para que a sociedade brasileira possa pensar na sua relação com os bens naturais".

Ao tomar conhecimento, nesta terça-feira, a Presidência da CNBB reafirma o que já teve ocasião de expressar. Em relação à transposição, a CNBB considera que:
• o Estado tem a responsabilidade de garantir à população o acesso à água de boa qualidade, que é um direito humano e um bem público necessário aos seres humanos, aos animais e às plantas;

• é necessário dar continuidade a um amplo diálogo visando a soluções adequadas e considerando as alternativas apresentadas pelas forças sociais populares envolvidas no processo, para promover o desenvolvimento sustentável, a preservação do meio ambiente, a agricultura familiar e a convivência com o semi-árido;

• é preciso cuidar da revitalização do Rio São Francisco e do respeito ao direito à terra dos povos da região, particularmente indígenas, quilombolas, população ribeirinha. Temos clareza que o tema da transposição do Rio São Francisco traz consigo muitas implicações, não havendo unanimidade nem mesmo na Igreja, o que julgamos perfeitamente compreensível.

Esperamos que o diálogo se estabeleça a fim de que a vida e a justiça prevaleçam sobre quaisquer outras razões.